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A Cultura do Movimento e sobre reconhecer o outro lado

É geralmente difícil para nós, praticantes, definirmos o que é a Cultura do Movimento. Do ponto de vista físico, é uma prática que não se compreende sem experienciá-la. Como prática de integração corpomente, não existe a noção de um cérebro que compreende sem que o corpo experiencie.


Mas defendo que existe também um motivo mais filosófico, mais existencial, para essa dificuldade de definição, que tem a ver com a própria ideia de movimento: o que está em movimento não pode ser aprisionado em uma definição estática. A Cultura do Movimento se transforma para cada praticante e ao longo do tempo individual e coletivo. Não é um conceito sagrado que paira acima de nós.


Nesse sentido, em seu generalismo, ela traz diferentes significados para diferentes pessoas. Para alguém muito ativo, a prática pode desenvolver calma, precisão, foco. Para quem é extremamente relaxado, a prática pode trabalhar força, confronto, explosão. Por isso dizemos que a prática do Movimento se confunde com a vida. Porque ela não toma lados, não define que existe um caminho para a salvação. Ela te mostra “o outro lado”. Aquele onde você não está. A prática de Movimento bem sucedida te mostra aquilo que você não alcança. E, se quiser alcançar, você vai precisar a se mover.


A boa prática de movimento é aquela que apresenta o yin ao seu yang e vice-versa. Ela parte da ideia de que se você não se move constantemente, você estará sempre do lado que não deveria estar. A prática é, para cada um, uma mudança de lugar. Por isso, para alguém de fora, que observa um instante sem conhecer e nem os indivíduos que estão praticando, é difícil definir e encontrar uma caixa para o que seus olhos vêem. A ideia do que está seno feito será limitada.


É comum que as diferentes disciplinas físicas tenham seus próprios dogmas. Existem disciplinas que cultivam o dogma da simetria, da superação de limites, da não-violência, ou do autocontrole por exemplo. A prática de Movimento pode ser qualquer uma dessas, e ao mesmo tempo não ser nenhuma delas. Depende para quem.


É, em suma, uma prática que não assume um ideal e tenta moldar a realidade a esse ideal,

mas sim uma prática que aceita a vida e o real em todas suas facetas e busca explorá-los em sua complexidade, ambiguidade e paradoxos. É a percepção de que um dogma só pode ser moralizado, definido como “bom” ou “ruim”, se entendermos a referência, o ponto de partida.


E é normal que pessoas que compartilham uma determinada personalidade ou visão de mundo se liguem a práticas cujo dogma confirma sua própria visão de mundo. Na prática do Movimento isso não acontece. Se for honesta, ela vai te expor ao oposto daquilo que você buscava. “O medo é onde o ouro está", diz nosso professor Ido Portal. Não é sempre o que queremos, mas talvez seja o que precisamos.

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